quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Como conviver com o inimigo dentro de casa? | Lições para o celíacos e para quem convive


"Moro com meus pais, irmãos (ou amigos) e todos consomem glúten. Como me cuidar?"

Vocês  não imaginam a quantidade de vezes que leio ou recebo perguntas assim. Nos grupos nas redes sociais, no email do blog, nas mensagens pela página no facebook. Todos com a mesma preocupação (o glúten e a contaminação cruzada) e mesmo problema (convivência com alguém que se alimenta do nosso inimigo). 
Então, eu pensei: "Por que não compartilhar minha experiência com outras pessoas"? 

Sim, eu moro com meus pais e irmã e eles comem glúten. Uns lerão e dirão: "Que absurdooooo! Como você vive em uma casa com glúten?" ou poderão acrescentar que minha família é egoísta, que deveria parar de comer também para que eu restabelecesse minha saúde. Eu não penso assim e vou te dizer porque. A saúde é minha e eu sou a única responsável por ela. Por meio das minhas escolhas, serei saudável ou não. Portanto, se meus familiares consomem glúten, cabe a mim entender que não tenho controle sobre o outro e nem posso obrigá-los a não comerem glúten da mesma forma que eles não podem me obrigar a comer alimentos com glúten. Quando eu compreendo isso, no fundo do meu coração, eu passo a viver melhor e em paz. 

Apesar da minha família não ser tãããão consumidora do glúten, eles comem pão (todos os dias) e macarrão (muito de vez em quando). Sim, de vez em quando eu acordo e tem migalhas de pão na mesa onde tomo café, de vez em quando minha mãe faz um café para as amigas com uma mesa repleta de alimentos com glúten. Nessas horas, antes de enraivecer, devemos nos perguntar uma coisa: nesse momento, eu tenho condições de sair de casa? Se sim, é uma boa opção, desde que você decida viver sozinho para sempre, você e uma casa 101% sem glúten. Mas se não, está na hora de transformar. E eu falo da sua transformação, não a da sua família. A única pessoa que podemos mudar é a nós mesmos, por mais que isso nos doa ou nos cause revolta. É claro que se a família também entende isso, a convivência fica muito melhor. 

Não vivemos isolados, sozinhos, dentro de uma bolha e rigidez não traz felicidade a ninguém. Mas, denovo, repito: a saúde é minha, eu sou responsável por ela. Logo, se eu transgrido a alimentação segura, se sou flexível em aceitar a contaminação e se como um pouquinho de glúten quando não resisto, a responsabilidade não é do outro, é só minha. Ter um celíaco na família exige paciência e respeito de ambos os lados. Se ninguém cede, fica impossível. 

Se você é o celíaco
- Tenha paciência, vá educando sua família e se não se sentir seguro com a alimentação feita, não coma. Diga o porquê e numa boa, prepare sua refeição. Sua saúde deve vir em primeiro lugar. Se o outro se melindra ou fica chateado com isso, é ele quem precisa rever sua forma de lidar com as situações e não você;
- Sempre que for comer a comida feita por alguém, certifique-se de que ali não tem risco de contaminação cruzada. Entenda que o ser humano é falho e pode se esquecer. Mesmo que a pessoa fique brava, não fique chateado e não faça com que isso deixe-o sem graça de perguntar nas próximas vezes. A cada vez que você lembra a pessoa sobre a sua condição, você está educando-a sobre a doença celíaca e suas questões;
- Esteja atento a preparações feitas com ingredientes que contém glúten (molhos, empanados, peixes e massas são pratos fáceis de terem farinha de trigo e/ou farinha de rosca) e preste atenção também a preparações feitas com ingredientes fáceis de estarem contaminados (margarina, geleias e afins);
- Não se esqueça de que o beijo é uma forma de contaminação cruzada - portanto, quando seu/sua companheiro/a consumir glúten, tenham um combinado de ficarem nos selinhos e abraços até que ele possa escovar os dentes;
- Viu migalhas de pão na mesa? Não espere que o outro limpe pois para ele isso não é prejudicial e é algo super normal;
- Repita inúmeras vezes até que você compreenda que ninguém nunca vai ter o cuidado que você tem consigo mesmo. E o conselho que posso te dar é: também não espere isso de ninguém;
Você é o responsável pela sua saúde e se tem alguém que pode te amar e te respeitar muuuuito, essa pessoa é você - portanto, só você pode fazer o melhor por você mesmo;
- Quando alguém tiver cuidado com a sua alimentação, seja imensamente grato - e se ninguém tiver, mais um motivo para você se amar mais e mais;
- Quando bater raiva ou indignação, saia da situação, vá para um canto tranquilo e faça aquilo que você sempre faz para se acalmar (você pode bufar, respirar lentamente, contar até 10, rezar);
- Se estiver difícil se responsabilizar por tantas coisas, busque ajuda entre outros celíacos ou ajuda profissional (importante que o profissional tenha conhecimento do seu diagnóstico para não achar que tudo é psicológico);
- Denovo, tenha paciência - quando fazemos a nossa parte, a vida reconhece e nos presenteia com algo de bom; seja persistente e alimente esperança no seu coração;
- Leia todas as dicas abaixo, imaginando-se estar no lugar de quem convive com você - empatia funciona para resolução dos problemas.

Se você convive com um celíaco
- Tenha paciência, permita-se conhecer coisas novas que são passadas para você - afinal, o mundo muda a todo instante e o que você sabe sobre muitas coisas pode não ser o conhecimento mais atual alcançado pela ciência;
- Se o celíaco preferir não comer a sua comida, não se melindre; coloque-se no lugar dele e entenda que a situação é tão embaraçosa para ele quanto para você;
- Se for cozinhar, não tenha vergonha de perguntar e se informar, afinal aprender é algo muito nobre - celíacos estão acostumados a ensinar e a falar sobre seu cotidiano; costumam gostar de responder sobre a curiosidade das pessoas; só não gostam (aliás, detestam) ser confrontados nos cuidados necessários ou colocados para baixo (mas isso ninguém gosta, né?);
- Compreenda que cada um de nós somos responsáveis pela nossa saúde - portanto, o celíaco é responsável pela dele; não subestime isso duvidando de seu diagnóstico ou sintomas;
- Jamais faça perguntas irônicas que dêem a entender que o celíaco está com frescura - doença celíaca é uma doença autoimune e o tratamento para que a saúde não esteja prejudicada é dieta isenta de glúten, inclusive traços dele;
- Pare de fazer cara feia e permita-se aprender algumas coisas com o celíaco; ele pode ser um bom exemplo de pessoa disciplinada e cuidadosa;
 Leia todas as dicas acima, imaginando-se estar no lugar do celíaco - empatia funciona para resolução dos problemas.

Se você é o celíaco ou quem convive com ele
- Separem, na dispensa ou no armário da cozinha, prateleiras para o armazenamento dos alimentos do celíaco;
- Separem torradeira, geleias, margarina;
- Combinem uma maneira de sinalizar tudo o que for do celíaco - adesivos coloridos são uma boa forma de indicar aquilo que não pode ser usado por outras pessoas;
- Aprendam a ceder em alguns momentos, mas lembrem-se que o que está em jogo é a saúde de uma pessoa - deixem de orgulho e vejam o que é possível fazer e que fica bom para os dois lados;

Lembrem-se, família e amigos são uma das melhores coisas do mundo. Embora muitas vezes eles não sejam como gostaríamos, eles nos ensinam muito, principalmente nas situações difíceis. Tudo pode se ajeitar e dar certo, desde que ambos estejam dispostos para isso. 

Deixem o orgulho de lado, estejam abertos, respeitem-se e dialoguem muito!


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